Poesias, crônicas, contos e dramaturgia escritas por: Geraldo Bernardo, tendo como cenário o sertão, seus personagens e mitos.


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ZÉ PIMBA, A HISTÓRIA DE UM DOIDO SABIDO. ESCUTADA E RECONTADA PELO DOIDO ARUPEMBA DE CÃINDA.- cap 1- UMA HISTÓRIA DE DOIDO.

Escrito por : Geraldo Bernardo em sábado, 13 de outubro de 2012 | 6:50 AM




UMA HISTÓRIA DE DOIDO. 
Virou Zé Pimba. Podia até ser um... outro qualquer Zé. Porque desde os tempos que Jáquisson disse que aquela terra era terra de Zé, “que vixe cuma tem Zé”, foi ele dizer cantando assim daquele jeito que ele cantava que... cada vez mais tem aparecido Zé. Zé de Fátima, Zé Lombriga, Zé Brito, Zé Pombal, Zé Furiba, Zé de Chica Mulungu, Zé Priquitinho, Zé Cabrito, Zé Juvino, Zé Buchudo, Zé da Silva e Zé Linguarudo. É tanto Zé que devia de aparecer um Zé Pimba, até porque já havia um Zé da Cacimba que foi onde o nosso Zé escorregou e... Pimba... ficou com as pernas pra riba e as fuças dentro d’água. Daí que ponharam nele o bendito nome de Zé Pimba, pois não podia ser um Zé Dendágua, porque esse era o nome do mineirinho que havia se enrabichado com Daquina, a menina-moça de Zé Preá, quando essa viajou pra visitar os parentes distantes e voltou trazendo aqueleunzinho que também era Zé.
Daquele povo sem sabença de sabido sabedor das letras, Zé Pimba era o mais afortunado com as palavras escritas. E como começou tudo isso? Pra saber dessas acontecências acontecidas, é preciso que o doutor coronel saiba antes dos acontecimentos que se aconteceram nos dias de antes de acontecer o nascer do Zé, aí então o doutor vai entender porque os entendimentos do Zé Pimba era um pouco misturado nos entendimento dos entendidos das letras com o entender daquele povo que entendia de tudo, mas que era de um entendido diferente, um entender de ver, de sentir, de cheirar, de comer. Porque, quem assim entende, fica mais entendido do que quem só entende de ouvir dizer ou dos entendimentos das letras escritas pelos entendidos das escolas importantes que entendem tudo separado. Não. O entender de nosso jeito é um entendimento mais entendido, mais compreendido porque é feito e aprendido no mesmo instante que é provado. É como saber que vai chover porque a jia tá rapando no fundo da loca de pedra. Esse entendimento assim fica mais compreendido. Entendeu?
Pois é.
Vamos lá! Zé Pimba trazia nas entranhas da hereditariedade, que é uma herança que ninguém vê que vê, herança assim que já vem dentro da gente, porque passa no instante do gozo da mãe com o pai, uma herança que carrega os dois misturados dentro do sujeito que herda. Às vezes é o cabelo ruim misturado com os olhos azuis. Zé Pimba herdou daquela mistura que já vinha misturada nos pais um bocado de coisa, ficou assim como o sarapatel de Dona Madalena, onde ela coloca tudo junto, bofe, fígado, tripas, sangue, rim, bucho tudo junto e dá aquela comida gostosa. Pois Zé Pimba era assim, podia num ser gostoso, mas era misturado. Do cabelo enrolado, com os olhos castanhos, o bigode agalegado, as ventas de bezerro novo, corpo alto e bem delgado, as orelhas de abano e o quengo achatado. O verdadeiro “cabra” do sertão. Um sarapatel de gente. E desta herança misturada, de onde tudo se colocou, veio as inteligências da mãe, vinda dos lugares de quem viaja, das bandas do Ceará, e, do pai, sabedoria que aprendeu saber no viver, no acontecer dos dias, sabedorias de roça, nunca saído pro mundo, mais sabedor de um tudo da natureza.
E num é que Zé Pimba foi ficando sabido com as sabedorias herdadas misturando tudo?
Cada coisa esse cabra foi fazendo, ao tempo que ia crescendo, sempre o primeiro em tudo, já que foi o que primeiramente nasceu na casa de seus pais. Primeiramente foi de tudo provando, o primeiro barrete, a primeira cagada, a primeira mamada, foi o primeiro xodó durante quase um ano quando surgiu o irmão, seus pais que só se aquietaram durante o resguardo. Nessa receita temperada de sertão com ausência televisiva nasceram, daquele tronco, dezesseis. Doze vingaram, quatro se foram de caganeira, antes de completar os primeiros doze meses.
E Zé Pimba?
Deixe que eu lhe conto cada coisa feita por esse Zé, mas não vai ser tudo num dia só não, que é coisa que toma muito tempo. Coisa assim a gente só conta aos pedacinhos, desde que uma tal de Sherazade, lá das bandas do outro lado do mundo inventou,  que existe este invento, invento de contar sem terminar, pois o senhor – doutor coronel – me aguarde é o só o tempo do sol dar a volta lá pelo Japão que eu lhe conto o resto da história desse Zé.
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