Poesias, crônicas, contos e dramaturgia escritas por: Geraldo Bernardo, tendo como cenário o sertão, seus personagens e mitos.


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ZÉ PIMBA, A HISTÓRIA DE UM DOIDO SABIDO. ESCUTADA E RECONTADA PELO DOIDO ARUPEMBA DE CÃINDA. - cap 2 - DAS PRIMEIRAS ACONTECÊNCIAS ou QUANDO A DOIDEIRA COMEÇOU A DOIDEAR ZÉ PIMBA!

Escrito por : Geraldo Bernardo em quarta-feira, 17 de outubro de 2012 | 10:32 AM



DAS PRIMEIRAS ACONTECÊNCIAS
ou
QUANDO A DOIDEIRA COMEÇOU A DOIDEAR ZÉ PIMBA!

        Geraldo Bernardo

Num lhe disse doutor-coronel que quando o sol voltasse do Japão eu tava aqui de novo? Pois, pagando o prometido. Empreste-me seus ouvidos de ouvir e as vistas de se ler. Pois se inté Claudinha, aquela que tem os olhos azuis da cor de céu espanado, quando não há sinal de chuva, inté Claudinha se achegou pra mode ouvir meu dizer e meu contar de Zé Pimba, não é o senhor que agora vai arrefecer o fazedio de escutar os prolegômenos desse Zé. Assim, devagarzinho, dia sim dia não, eu conto tudinho como se assucedeu e o porquê se deu de Zé ser quase doido, quase sabido, uma vez que nem era uma coisa nem outra, antes pelo contrário, era tão sabido que parecia doido ou então era tão doido que parecia sabido. Vixe! Que agora num sei não!
        Uma vez, falando pra se explicar, com quem costuma de ser sabedor das cabeças dos outros, uma tal... doutora de psicologia, lhe falou das “variáveis” em cada mente. Um dessas doutoras, que acham por bem de saberem de tudo da gente, que vivem alegando que a gente não sabe nada de nós. Pois bem, numa dessas tais vezes, isso já depois dele, Zé Pimba, já ser entendedor de quase todas as havenças desse mundo. Num é que o danado contou, assim buscando lá nas lembranças mais derradeiras, dos tempos de menino, lembranças essas que são difíceis de se achar, são lembranças de fleshibéqui, como disse uma doutora sabida. Pois, nesses esconderijos de lembranças Zé Pimba encontrou um dia de domingo lá pelos três ou quatro anos de idade, assim a precisão da data é preciso dizer que ele não precisava muito não. Tampouco o lugar num é lá essas coisas de certo. O certo é que naquelas infâncias vividas numa roça qualquer que tanto podia ser: Logradô, Picada, Varjota, Caiçara, Malhada Grande, Tabuleiro, Várzea de Cima ou de Baixo, naqueles caminhos de roça, onde o pega-pinto e o carrapicho se agarram na gente e fazem companhia espetando e arrancando os pêlos das canelas de quem tem pêlos nas canelas, Zé Pimba que ainda nem Zé Pimba era, andou pra mais de meio dia.
        Foi assim mesmo.
        As lembranças começavam a sair do escuro da memória e aparecia nas imagens que ficam dentro da cabeça da gente pra só aparecer no dia em que a gente sente uma coisa parecida, de quando viveu aquele passado que já passou, e que sempre vem acompanhada, de um som, de uma fala...
        Chegando assim uma por uma, as lembranças, vinham de trás pra frente e do meio pro fim. Vinham com a quilaridade e a quenturidade do sol da manhã, com os pés fazendo açude de bolhas debaixo das correias da japonesa havaianas que tão carcomida nos seixos, só amparavam a metade do pé encaliçado, pra completar, vez por outra saía o cabresto.
        Ah! Tinha o pai que berrava. Berrava quando ele parava pra botar o cabresto e tinha que sair correndo para acompanhar aquele homenzarrão do qual Zé Pimba era fruto das entranhas. Tinha todos os gritos do pai, que chamava a gota serena, pra ajudar naquele sacrifício. Dar uns croques cada vez que era perguntado se o destino ainda era longe. E era lonjura que só a gota. Tinha a mãe também, com medo do pai, e, com os dois outros irmãos nos escanchamento dos quartos. Tinha a mãe que pedia pra parar e limpar os cueiros cagados e tinha o pai que berrava ainda mais. “com os seiscentos mil diabos” desse jeito não iam chegar nunca, melhor não parar.
        E a sede?
        “Filho meu tem aprender cedo, ouviu ente ruim, molesta dos cachorros?”
        Zé Pimba não se lembrava do fim da caminhada, pois essa lembrança tava bem mais escondida. Não tinha a idéia se desmaiou ou se chegou. Mas, aprendeu deste dia em diante a temer o pai mais do que amá-lo. O amor era um terror, um pavor que tinha início quando seu nome era mencionado. Bastava um “Joooosééé” e um fungado que Zé Pimba ajeitava o cabresto das havaianas em flagelo e corria para acompanhar o pai, sem desperdiçar a oferta de caçuletas e croques que o pai distribuía com generosidade. “anda quizila, parece um jumento morto”. E ele andava, andava não, corria se esforçando para acompanhar o genitor naquela marcha militar, sem cadência, mas de largas passadas.
        Essas memórias passadas nas lembranças escuras foi uma das primeiras que lembrou de contar para a doutora que lembrara de cuidar dele, Zé Pimba, pois na escola disseram que ele, o próprio Zé Pimba era meio aluado. Mas, aluado, pensava Zé Pimba, num é astronauta que quer ir à lua? Respondia na pergunta e todo mundo mangava. Foi por isso que a doutora, que diz saber mais da gente que a gente mesmo, mandou que ele fosse ao consultório.
        E era tanta coisa limpa naquela sala da doutora, caneta de tantas cores. Zé Pimba estava brincando com a coleção de lápis de pintar e pensando no arco-celeste, que nos livros se chamava arco-íris, foi quando a doutora começou com aquelas perguntas de forçar a cabeça da gente e fazer a gente dizer as coisas que a gente não sabe que sabe e só ela, doutora sabida, é que sabe.
        Mas, a maior decepção que Zé Pimba teve naquele dia, seu doutor-coronel e menina-linda Claudinha de azulado olhar, foi não ter tomado injeção. Veja só que coisa de doido, que desarrumamento total das curas, a doutora de branco, ela que sabia mais de Zé Pimba que ele mesmo, negou-se a enterrar a agulha no braço de Zé Pimba. Olhe que ele implorou:
            “Doutora como é que eu vou ficar bom desse jeito? Se a senhora não que me dá remédio?”
            Então ela despachou um converseiro tão comprido que Zé Pimba achou melhor ficar brincando com aquela coleção faber castel. Pensava em pintar um carro e uma estrada pra não ter que andar tanto e correr tanto, no pedregulho, naquela manhã que estava bem escondidinha, sem mal nenhum fazer, e que a doutora queria arrancar do esconderijo das lembranças.
        Foi quando a doutora, toda de branco e conhecedora das coisas que nem mesmo a gente sabe que sabe, ofereceu-lhe uma folha de papel. Bastou isso seu doutor-coronel e menina Claudinha de olho azul e riso doce, para que Zé Pimba começasse a pensar em desenhar uma vaca parada no seu lugar, para não ter que correr tanto até não mais sentir as pernas, do jeito que correu quando a vaca Chuíte saiu do reservo e o pai disse que o mataria se....
        Bom mais isso é outra história e eu num tô doido de tomar mais o tempo de vocês, agora depois que o sol deixar a lua alumiar um pouco meu juízo eu conto, pode ter certeza.

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