Poesias, crônicas, contos e dramaturgia escritas por: Geraldo Bernardo, tendo como cenário o sertão, seus personagens e mitos.


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ZÉ PIMBA, A HISTÓRIA DE UM DOIDO SABIDO. ESCUTADA E RECONTADA PELO DOIDO ARUPEMBA DE CÃINDA. Cap. 5 - PAGADÁ, PAGADÁ, PAGADÁ, PAGADÁ.

Escrito por : Geraldo Bernardo em sexta-feira, 16 de novembro de 2012 | 2:16 AM







PAGADÁ, PAGADÁ, PAGADÁ, PAGADÁ.
Geraldo Bernardo
 
        Eita! Esse negócio de ajuntar gente tá ficando meio graúdo.
Pois, vocês se abanquem (aqui pra nós – “o carteiro cajazeirado deve ter trazido uma das ‘boa’, pra mode móiá a goela). Se achegue que nós vamos perseguir as vivências deste ente vivido no eito do tempo. Cabra véio  vividor, cabôco das roças e da rua e que nós ainda nem começamos a contar as estrepolias vividas nas pontas de rua, lugar onde o povo chama de periferia, pois ele ainda é um menino, meio que infuluído, mas é menino, nem calça comprida usou ainda e já meteu na cabeça de se apaixonar, esse cabeçudo, das idéias mais frouxas que as calçolas da finada Maria (que Deus tape-lhe as ouças).
         Mas, pra que primeiramente a gente comece pelo começo, que na verdade é o fim de onde deixamos, precisa-se de que os outros companheiros que já nos acompanha nessa estrada cheia de veredas saindo por todos os lados, como eu dizia, precisa-se, num é verdade Lúcio Flávio? Precisa-se dizer que a moleca véia Daquina, que todos vocês já conhecem, tava indo deixar a panela de angu com galinha na roça, porque aquele era o almoço do pai dela, o Zé Preá, que inté ainda era meio parente do Zé Pimba, aquele cabinha meio infuluído que mais parecia um papagaio do cu roído, mas que era doido por Daquina, como todos vocês já sabem, num é professor Martins, poeta das engenhosidades mecânicas?
         E Daquina, que seguia sozinha naquela hora em que a cigarra assobia sem parar, parecendo que tá se assoprando do solzão de meio-dia, apois num é que de repente aquele piado de cigarra que a gente não acha nunca, foi interrompido. Foi interrompido por uma zoada que fazia assim: pagadá, pagadá, pagadá, pagadá – num era: pocotó-pocotó-pocotó-pocotó – era não. Era - pagadá, pagadá, pagadá, pagadá – coisa diferente de ser escutada daquele jeito, pois a cadência daquele pagadá era de dum desembestamento tão... tão desmedido que parecia o trotear da besta-fera quando bate as sete pruvinça.
         Num devia de ser uma pessoa montada num jumento, porque jumento faz pocotó (égua também), cavalo num era, cavalo faz um pocotó cheio de charme, quase um pucutum, tinha de ser um bicho mais pesado, um... um... boi? Mas, o pagadá de boi num era daquele jeito, Daquina sabia muito bem que só quem faz uma sonoplastia daquela é bicho amuntado e açoitado. E, “quem havera de andar muntado num boi?” Ela pensava perguntando, porque isso era pergunta mais que descabida, primeiramente porque boi num é bicho que sirva de montaria, “adispois – num desembestamento daquele...”
         Por causa da hora sagrada do sol do meio-dia, que tem a força dos mistérios da meia-noite, só que sendo invertido, Daquina começou a ficar um tantinho assustada, ainda abriu a boca e disse:
         “Ôxe, que presepada é essa?”
         Juro a você Vilminha, como se lá estivesse eu olhando aquilo lá. Chego fico arrepiado só de pensar. E o “pagadá, pagadá, pagadá, pagadá” foi ficando mais perto e mais alto. Daquina começou a se agarrar com um rebanho de nome de santo e buscou força nas canelas que negaram motricidade.
         “Agora? Vixe NossaSenhora, mãe de JesusCristim, o que será de mim? Isso deve ser o cão”
         “pagadá, pagadá, pagadá, pagadá
         Daquina procurava se esconder, mas ali era só lajedo e o sol alumiando, abrindo um clarão de geral para o solo de cigarra.
         “pagadá, pagadá, pagadá, pagadá
         A cigarra encerrou apressadamente seu número e recolheu-se no sinistro do silêncio momentâneo que mais parecia um esconderijo de catacumba. O coração de Daquina querendo sair pela boca e ela de dente trincado pra segurar as cordas da emoção que já enviavam de dentro do peito pulsante um bolo, daqueles que vem arrebentando tudo e que quando chega ao céu da boca é choro ou grito de terror.
         Daquina quase não acreditou, quando avistou aquilo.
         Pois num é professora Elizeth, talvez a senhora nem acredite nisso, que é coisa deste sertão mesmo, diferente das terras gaúchas. Mas, pode ter certeza do que lhe digo e Lúcio Flávio aqui, que não me deixa mentir, sabe que presepada de paixão sertaneja num é coisa pouca não.
Pois foi isso, Zé Pimba vinha escanchado no espinhaço do toureco Mimoso, os pés cruzado no vazio do bicho, deitado no lombo do animal e agarrado com a castanha adolescente daquele bovino, vinham fungando os dois, olhou para o susto que os olhos de Daquina gritava e disse:
            “Tá vendo como eu também sei ser caubói?”
            E foi passando direto, porque o freio do toureco não atendia a nenhum comando. Estavam os dois, Zé Pimba e Mimoso, vivendo um corpo só.
         Aquele bolo que vinha saindo de dentro de Daquina, chega vinha recheado de terror, virou na horinha mesmo, ali no meio daquele lajedo, virou numa ira tão grande, num dá nem pra medir a imensidão daquela fúria, as lágrimas que já vinham cachoeira para os olhos de Daquina, viraram labaredas de ódio e então ela gritou para o abestado do Zé Pimba:
         “Deixa de ser doido, leso véio. Tomara que caia uma queda e quebre o pescoço, seu... abestado.” E, para humilhar, arrematou: “suba e desça e de mim se esqueça, caboré de loca
         Ele ouviu, ouviu tudinho, mas, tempo de responder num teve. É que o bezerro “riscou” bem em riba de uma touceira de xique-xique. A sorte de Zé Pimba é que na velocidade em que vinha, voou desmanteladamente, caindo adiante no lajedo quente em brasa.
         Daquina aproveitou pra cair na gaitada, enquanto Zé Pimba tentava levantar-se com as ventas saindo sangue, o couro da testa ficou enfeitando o lajedo e a vermelhidão do sangue se fez máscara. Zé Pimba não tinha o que dizer, levantou-se, pegou o toureco cansado e saiu engolindo o choro enquanto Daquina gargalhava de propósito.
         Ora, nem bem passou uma semana, tava ele lá de novo, inventando um meio de fazer as pazes. Foi aí, nesse novo invento que todo mundo passou a dizer que ele era doido. Mas, peraí... tão me chamando prum golinho de café, vou buscar, quer também Claudinha?...

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